Ronaldo Rogério de Freitas Mourão
Na noite de 24 de fevereiro de 1987, o assistente de noite Oscar Duhalde, do Observatório norte-americano de Las Campanas, no Chile, às 4h 40min T.U., e o astrônomo amador Albert Jones, em Nelson, Nova Zelândia, às 7h 54min T.U., descobriram independentemente a supernova SN 1987A (letra A, após 1987, significa ser a primeira estrela deste tipo, SN, descoberta neste ano), com uma magnitude visual aparente de 4,5 - facilmente visível a olho nu -, ao lado da nebulosa gigante de Tarântula (30 Doradus), na Grande Nuvem de Magalhães, na constelação de Doradus (Dourado).
Nesta mesma noite, às 5h 30min T.U., o astrônomo canadense Ian Shelton, da Universidade de Toronto, em missão no Observatório de Las Campanas, no Chile, identificou um novo objeto em sua placa fotográfica obtida com o astrógrafo de 25cm de diâmetro, atribuindo-o inicialmente a um defeito na emulsão fotográfica. Ao observar o céu, com seus próprios olhos, verificou Shelton que não estava sonhando: havia descoberto a mais brilhante supernova observada desde 1604.
Como a Grande e a Pequena Nuvem de Magalhães - duas pequenas galáxias satélites da nossa Galáxia - estão situadas a cerca de 150.000 anos-luz, podemos afirmar que a curso de rh, levou 150 mil anos para chegar até nós. Na realidade, assistimos em 24 de fevereiro um evento cataclísmico que ocorreu na Grande Nuvem de Magalhães muito antes do aparecimento do Homo Sapiens sobre a Terra.
Sua descoberta provocou uma enorme agitação e euforia entre os astrônomos de todo o mundo: era a primeira vez que uma supernova relativamente próxima a nós e visível a olho nu, poderia ser estudada pelos astrofísicos com os novos métodos de observação, desenvolvidos depois que Galileu, em 1610, utilizou pela primeira vez um instrumento para observar os astros. Com efeito, embora mais próxima 30 mil anos-luz, na direção do centro de nossa Galáxia, a SN 1605 foi estudada por Tycho-Brahe, Galileu e Kepler, com os reduzidos métodos disponíveis àquela época. Em virtude do seu brilho, a SN 1987A constituiu uma festa para os habitantes do hemisfério sul que tiveram a sorte de observar as últimas luzes de uma estrela que desapareceu há aproximadamente 160 milênios.
As conseqüências científicas desta descoberta são inimagináveis. De início permitiram compreender, com mais exatidão, os processos cataclísmicos que se seguem a` morte de uma estrela muito maciça. A determinação do seu brilho intrínseco está tornando possível rever e recalibrar as escalas das distâncias em todo o universo, e, em conseqüência, a sua idade.
Por outro lado, os físicos em partículas elementares e os astrofísicos nunca tiveram tão boa oportunidade de trocar seus pontos de vista sobre o infinitamente pequeno e infinitamente grande, como na ocasião da detecção, na superfície terrestre, dos primeiros neutrinos emitidos pela supernova há 150 mil anos. Com efeito, o seu registro permitiu informações da máxima importância sobre as propriedades (massa, tempo de vida, etc) destas partículas, bem como sobre o panorama teórico proposto para compreender a formação das estrelas de nêutrons.
Várias questões surgiram, após o aparecimento desta supernova: por que esta estrela não começou a reduzir logo o seu brilho, como ocorre com este tipo de astro? Será possível localizar, ou melhor, identificar, em fotografias anteriores, traços da estrela que explodiu? Iriamos assistir ao aparecimento de uma nebulosa, resto dessa supernova, como já ocorreu com as outras que deixaram uma nebulosidade como vestígio de sua explosão?
Para responder a todas estas questões, uma centena de astrônomos vão se reunir entre os dias 22 e 28 de fevereiro, em La Serena, no Chile, para examinar as informações acumuladas durante dez anos de observação dessa explosão que iniciou-se há 150 milhões de anos e continua enviando para a Terra novos dados sobre a composição química das estrelas, do cosmos e da matéria.
Publicado no Jornal do Commercio, Caderno Atualidades, 16 e 17 de fevereiro de 1997
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